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Como as emoções funcionam e quais são as suas características centrais

Atualizado: 9 de ago. de 2022

Depois de entender a lógica do funcionamento das emoções e os seus efeitos no nosso organismo, vamos entrar mais a fundo em suas características e mecanismos principais.


1. Distinguindo emoções de sentimentos e pensamentos

Primeiramente, vamos fazer uma distinção mais clara entre emoções, sentimentos e pensamentos.


Sentimentos são a nossa parcela subjetiva, experiencial, vivencial e consciente das emoções. Pode parecer que os sentimentos contemplem todos os aspectos da emoção, mas a realidade é que são (como ilustrado por Sigmund Freud) a ponta do iceberg de todo o funcionamento emocional. Os sentimentos também podem abarcar outras experiências subjetivas, como intuições ("senti que havia algo de errado no seu pedido de desculpas") e sensações corporais (como dor e calor). Apesar dessas formas conscientes serem experimentadas todas como sentimentos, elas são fundamentalmente diferentes entre si no seu funcionamento mental e cerebral.

As intuições, embora possam ser sentidas (quase como emoções), têm origem nos pensamentos, que são puramente mentais. Os pensamentos são livres para serem devaneados e ocorrem sem repercussão, até o momento em que engatam em algum significado particular para a pessoa. Nesse momento, eles geram as emoções, que criam, como explicado, o fluxo de mobilização dentro do organismo. Os pensamentos podem ocorrer consciente e, de maneira até mais frequente, inconscientemente.

Para os nossos fins, utilizaremos sentimentos e emoções quase como sinônimos e intuições, apesar de serem “sentidas”, ficarão na categoria de pensamentos, por terem um papel bem distinto na formação da nossa vida emocional.

2. Quais são as diferentes emoções que podemos ter?

Há diversas maneiras de responder a essa pergunta. A mais simples delas talvez seja listar todas as palavras que expressam algo de cunho emocional e que não sejam sinônimas e, então, contá-las. Cada uma das palavras poderia expressar uma emoção particular, isto é, um modo de se sentir e reagir diante do mundo. Por exemplo, cada uma das seguintes palavras expressaria uma emoção diferente: preocupado, irritado, tenso, aborrecido, melancólico, ofendido, animado, ressentido, furioso.

O que observamos, no entanto, é que essas palavras tendem a se agrupar em emoções mais básicas e fundamentais. Por exemplo, irritado, aborrecido, ressentido, ofendido e furioso são expressões de sentimentos dentro de uma mesma emoção - a emoção de raiva. Apesar disso, essas palavras têm sentidos próprios e não são intercambiáveis entre si e nem são intercambiáveis com a raiva sem alguma perda de informação e sentido. Dizer que alguém ficou ofendido traz um significado diferente do que dizer que alguém ficou ressentido.

Para entender esse fenômeno uma ótima analogia é com as cores. Nas aulas de artes as crianças aprendem que elas podem misturar as tintas para formar cores novas. Cada gota a mais de amarelo muda o vermelho até formar o laranja. Nas aulas de física, aprendemos que cada cor tem a sua frequência e na aula de biologia aprendemos que elas são captadas por três tipos de cones - células foto-sensíveis - que moram em nossos olhos e traduzem as ondas luminosas em cores particulares. O que é importante para nós aqui é que é possível formar todo o arco-íris a partir dessas três cores principais, que poderíamos chamar de cores primárias. As cores secundárias seriam as cores formadas pela mistura das cores primárias, e assim por diante. Do mesmo jeito, as emoções podem ser divididas entre emoções primárias, secundárias e até terciárias, dependendo da mistura que houver em nossas mentes. Assim, algumas emoções são as básicas e, dependendo da composição que experimentamos, temos as outras emoções secundárias e terciárias. Da mesma maneira que o azul e amarelo se juntam para formar o verde, duas porções de raiva e uma de nojo podem se juntar para formar o desprezo, e três de tristeza e duas de medo podem se misturar para formar o desamparo. Um outro modo que as emoções variam é na sua intensidade. Assim como um verde pode ser mais claro ou mais escuro, a alegria pode ser mais ou menos intensa.

Esse modelo de como entender as emoções foi bem desenvolvido por Plutchik, que criou a Roda das Emoções (na figura abaixo), em que elas se distribuem em uma roda e um cone, variando em intensidade, similaridade e composição. O modelo também pode ser desenvolvido em um círculo com várias linhas conectando as diferentes emoções, em que cada linha representa a junção dessas emoções.


3. Emoções têm bases biológicas

O modelo teórico de Plutchik é certamente atraente pela sua simplicidade e elegância. Ele é interessante também por ser muito didático e expor as duas características das emoções explicadas até aqui: (i) o aspecto de composição a partir de emoções mais básicas e (ii) a graduação das emoções em níveis de intensidade. Apesar disso, a elegância demonstrada por essa teoria se assemelha a um quebra cabeça que tem suas peças recortadas e deformadas para fazer uma linda imagem que é mais esquemática do que precisa, pois a realidade é ainda mais complexa.

As investigações neurológicas, por exemplo, mostram que emoções diferentes são reguladas por centros diferentes no cérebro que surgiram em momentos particulares de nossa história evolutiva. No final das contas, cada emoção será idiossincrática no modo como interage com a nossa mente, com o nosso cérebro e com o nosso corpo. Podemos entendê-las melhor neurologicamente categorizando o nosso cérebro em três camadas: o córtex cerebral, o sistema límbico e o cérebro reptiliano.

A camada do meio (abaixo do córtex e acima do cérebro reptiliano) é o sistema límbico e é a casa das nossas emoções. Ele é composto por diversas estruturas cerebrais na região mais central do nosso cérebro, que também é compartilhada com outros mamíferos sociais. Em estudos de neuroimagem, é o sistema límbico que consistentemente se acende quando os sujeitos de pesquisa se emocionam.

O sistema límbico se comunica com as outras duas partes do cérebro, mandando e recebendo informações. Algumas emoções podem estar mais ligadas com partes mais primitivas do nosso cérebro, como é o caso do medo, que tem estreitas relações com o nosso cérebro reptiliano, que é quem controla a fisiologia do corpo em um nível de regulações automáticas homeostáticas, como temperatura, nível de glicose no sangue e respostas ao estresse e ameaças. É por isso que o medo produz instantaneamente sintomas como palpitação, suor e tensão muscular.

Já outras emoções, como as chamadas emoções sociais (vergonha, culpa e embaraço), estão mais ligadas à parte mais recentemente evoluída e mais complexa do nosso cérebro, o nosso córtex cerebral. Estas emoções necessitam do que os psicólogos chamam de teoria da mente, que é uma percepção e entendimento sobre o que os outros seres estão pensando e sentindo.

4. Expressões faciais e as emoções universais

Além de uma análise linguística e neurológica, podemos buscar os diferentes tipos de emoções através das respostas automáticas corporais que elas causam, como na postura e especialmente nas expressões faciais.

Charles Darwin foi o primeiro a notadamente descrever em detalhes as expressões faciais entre humanos e animais, sugerindo uma origem natural e universal para as emoções básicas. Essa teoria foi corroborada pelo renomado trabalho de Paul Ekman, que demonstrou que as expressões faciais e a percepção da expressão de emoções básicas são encontradas em todas as culturas, sugerindo a existência de ao menos seis emoções básicas universais - raiva, repulsa, medo, alegria, surpresa e tristeza.

Ainda há grande divergência na precisão dos conceitos, especialmente em modelos teóricos voltados para a pesquisa e refinamento conceitual, mas, para fins práticos de autoconhecimento e regulação emocional, podemos usar um modelo amplo que postula a existência de 12 emoções universais: raiva, repulsa, medo, culpa, alegria, ciúmes, inveja, tristeza, vergonha, surpresa, interesse e amor. Essa lista pode ter uma emoção a mais ou a menos dependendo de quão básicas e primárias quem a utiliza quer que elas sejam. Mas, de modo geral, são todas amplamente encontradas em nossa cultura. Nós nascemos com o potencial e prontidão biológica para o seu surgimento e as desenvolvemos dentro de nossa sociedade. Assim, essa lista é uma boa base para nomearmos as nossas emoções e, por fim, nos entendermos.

5. Mais um sentimento - emoções e intuições

Para complicar um pouco mais, existe uma outra categoria de sentimentos que ainda não distinguimos das emoções. As palavras dessa categoria têm um cunho emocional, mas não são emoções propriamente ditas. Elas são a combinação das emoções com interpretações, percepções ou intenções sobre a situação que estamos vivendo. Por exemplo, "desamparo" é a junção da tristeza de não ter apoio com um tanto de medo do que está por vir sem este suporte, mas palavras como "rejeitado" trazem informações não só do que sentimos, mas também do contexto. "Rejeitado" traz a ideia de que houve um interesse de uma aproximação a alguém que recusou esta investida. Em casos como esse, a palavra não designa uma emoção, propriamente dita, mas sim uma mistura de emoções com interpretações (intuitivas) dos eventos que aparecem com um sentimento.

A seguinte lista é o exemplo de uma compilação de palavras tipicamente usadas para expressar como nos sentimos dentro de cada emoção negativa.

ANSIOSO

o Preocupado Apreensivo Em Pânico Nervoso Com medo

o Tenso Desesperado Inquieto Agitado Assustado

o Receoso Impaciente Aflito Agoniado

COM RAIVA

o Irritado Furioso Enfurecido Zangado Alterado

o Ressentido Ofendido Rancoroso Perturbado Desgostoso

o Transtornado Contrariado Prejudicado Inflamado Injustiçado

TRISTE

o Melancólico Deprimido Ferido Machucado Desanimado

o Abatido Desapontado Perdido Infeliz Miserável

o Descontente Desolado Apático Chateado Letárgico

INFERIOR

o Inadequado Inútil Indigno Sem valor Incorrigível

o Fraco Indesejável Inconveniente Desagradável Defeituoso

o Deficiente Falho Covarde Incompetente Dependente

ENVERGONHADO

o Embaraçado Irresponsável Tolo Ridículo Humilhado

o Desastrado Inadequado Desajeitado Constrangido Tímido

FRUSTRADO

o Desapontado Desiludido Preso Irritado Magoado

o Derrotado Decepcionado

CULPADO

o Mau Cruel Desprezível Arrependido Envergonhado

SEM ESPERANÇA

o Desesperado Pessimista Desiludido Desencorajado Desestruturado

ENCIUMADO

o Desconfiado Vigilante Inseguro Cuidadoso

SOLITÁRIO

o Abandonado Indesejável Sozinho Não amado Rejeitado

o Carente

ESTRESSADO/ CANSADO

o Pressionado Tenso Esgotado Exausto Farto

o Desgastado Sonolento Fatigado Sobrecarregado

ENTEDIADO

o Desanimado Desmotivado Aborrecido Desinteressado

CRITICADO

o Julgado Atormentado Importunado Repreendido Insultado

o Reprovado Rejeitado Penalizado Contrariado

VULNERÁVEL

o Fraco Frágil Exposto Indefeso Desamparado

Essa outra categoria de sentimentos - emoções misturadas com interpretações - traz a possibilidade da formação de inúmeras palavras para expressar como estamos nos sentindo. Há o famoso caso da palavra alemã "Schadenfreude", que significa algo como “o prazer que sentimos com o infortúnio alheio”. Perceba que não é só a junção de emoções diferentes, mas é o resultado de uma emoção (como a resolução da raiva ou da inveja) com a interpretação do contexto (alguém passar por dificuldades). Em português, temos o caso clássico da "saudade". Trata-se de um sentimento que mistura as emoções de tristeza e alegria (ou talvez o amor) com o contexto da falta de alguém cuja lembrança é positiva.

Douglas Adams, autor do Guia do Mochileiro das Galáxias, escreveu um outro livro que buscava, de uma forma cômica, dar nome a esses sentimentos que são resultado de emoções com interpretações, como Shoeburyness para batizar “a desconfortável sensação de sentar-se num lugar aquecido pelo traseiro de outra pessoa”. Daniel Martins, em seu livro "O lado bom do lado ruim", também faz a sua contribuição: "Cambé": o alívio experimentado quando descobrimos que não precisaremos prestar um favor que aceitamos contra a nossa vontade; e “Buíque": a frustração que sentimos quando nos pedem para fazer algo que já havíamos decidido fazer espontaneamente.

6. Humor

Ainda há um outro importante conceito que precisa ser diferenciado das emoções e melhor elaborado: o humor. O humor regula o nosso organismo do mesmo modo que as emoções - mobilizando a nossa fisiologia, vontades, sentimentos subjetivos e cognições. Embora haja divergências teóricas sobre a sua definição e características (como nas emoções), há um consenso que a diferença entre o humor e as emoções se dá em dois aspectos: (1) um humor dura mais do que uma emoção; e (2) um humor ativa respostas mais genéricas do que uma emoções.

1- Enquanto as emoções têm uma vida útil que pode ser contada em minutos (geralmente entre 2 e 30 minutos), o nosso humor se estende por horas, dias ou até semanas.

2- Ao passo que as emoções têm diversas manifestações e combinações, o humor varia em duas dimensões somente: no nosso nível de ânimo (positivo ou negativo) e no nosso nível de energia e excitação fisiológica (alto ou baixo).

Como o nosso humor varia nessas duas dimensões (do ânimo e da energia), em qualquer determinado momento, estaremos em algum lugar do seguinte mapa do humor:


Assim, podemos entender o humor como o nosso pano de fundo emocional. Se estamos no quadrante amarelo, tendemos a ver a nossa vida de um modo mais positivo e ter mais energia para as nossas atividades. No quadrante laranja, ainda temos energia para lidar com o dia, mas a nossa tendência será reagir negativamente aos acontecimentos.

Há uma relação bilateral do humor com as emoções. Se estivermos com o humor no quadrante azul (por exemplo, o que acontece cronicamente com pessoas com transtornos de depressão) sentiremos mais facilmente emoções como a tristeza e mais dificilmente emoções como alegria. Na mesma via, mas em sentido contrário, a emoção da tristeza desencadeia um humor negativo e sem energia, nos puxando para o quadrante azul. (Então, a tristeza é diferente do humor deprimido, que é um humor rebaixado e negativo e não uma emoção. Estar deprimido em alguns momentos faz parte de estar vivo e não é disfuncional. Estar deprimido somente se torna um diagnóstico de um transtorno quando se desregula e perdura por mais de duas semanas, de modo intenso e crônico).

Outras emoções têm a mesma relação com o nosso humor. A raiva nos deixa mais ativos e negativos, ou seja, um humor estressado ou nervoso. E, esse humor estressado ou nervoso, facilita o surgimento da raiva. Do mesmo modo, um humor tranquilo e relaxado dificulta a emoção da raiva. Talvez você já tenha percebido que, no momento em que está descansando de férias, os problemas não lhe afetam tanto quanto na correria do dia a dia.

Como o nosso humor tem uma vida útil grande, tendemos a estar em um desses quadrantes por um tempo - desde alguns minutos até dias, dependendo dos acontecimentos e das nossas reações a eles. Por exemplo, se recebemos uma promoção há muito tempo desejada, estaremos mais a fundo no quadrante amarelo e vamos demorar mais para voltar até o centro. O mesmo acontece caso haja perdas muito significativas - entramos fundo no quadrante azul e demoramos para retornar também.


 
 
 

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André Wageck

Especialista em terapia clínica cognitiva-comportamental pelo Instituo WP. Graduado em psicologia e mestre em filosofia da mente pela Universidade Federal do Paraná

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☎ (41) 98485-8089

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©2020 por André Wageck

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